quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

4º passo - o banco dos réus

Tenho sempre aquela sensação de culpa quando estou dentro do carro, à espera que fique sinal verde e, lentamente, me surge um carro da GNR que pára mesmo ao meu lado, com 2 figurões de óculos escuros, que me olham fingindo que não olham. Nada a fazer, assolapa-me aquele subtil formigueiro no estômago, tramado, que teima em permanecer enquanto revejo mentalmente todas as confirmações de que não estou em nenhum incumprimento da lei, tenho a carta, o livrete está ali, paguei o seguro,..., tudo ok, e tento persuadir-me de que estou inocente, mesmo sabendo que na verdade sou mesmo inocente!?!

É igual. No dia em que pedimos a abertura do processo para que os nossos filhos sejam sinalizados na escola por alguma dificuldade de aprendizagem ou outra, assinamos a sentença e, inevitavelmente, teremos que nos sentar no banco dos réus e sentir o tal formigueiro.

Não basta a dificuldade em si, a luta diária para tentar compreender algo para o qual não estamos nunca suficientemente preparados, a impotência que constantemente sentimos por não conseguirmos aniquilar uma característica que, assim de repente, nos parece uma barreira intransponível. Não basta. A sociedade faz-nos o favor de nos presentear com muito mais. Na melhor das intenções, seguramente, como será na melhor das intenções que a polícia patrulha as estradas, claro, para prevenir e/ou remediar. Espera-se.

Ainda assim, ainda que seja para isso que nos sentamos numa sala de reuniões banal, numa escola banal, numa cadeira banal, com 5 ou 6 profissionais dos quais sempre desconhecêramos a existência e que nunca mais viríamos a ver, profissionais esses muito condescendentes e sorridentes, ainda assim, ou precisamente por isso, o tal formigueiro tramado instala-se.

E percebemos o que sentem os nossos filhos, ao serem escrutinados num interrogatório aborrecido e, por vezes, um pouco melindroso e, também por vezes, um pouco humilhante.

Somos inocentes, caramba! Não somos é todos iguais. É preciso ter licença, para ser diferente? Uma autorização decretada por uns estadistas-gravatinhas? Chatice! Batatas e agrião, como dizia o Sr. Toupeira.
É só o que apetece dizer, batatas e agrião! Couves e chouriço!

Mas não, lá respondemos ao questionário, lá aguentamos com a avaliação da miúda, e a nossa, enquanto entidade parental. Sempre sorridentes, os profissionais condescendentes, e nós sempre a pensar «Estão a tomar demasiadas notas, o que é que terei feito de errado? O que é que falta? O que é que terei dito mal? Ou menos bem? Parecemos excessivamente protetores? Ai, agora parecemos descuidados. Ai!»

Mas bom, são só algumas sessões, a maioria só com 1 profissional, e a diretora de turma, sempre amável e presente. E nunca percebemos bem ao que vamos. E levamos a miúda? E não levamos? «Como preferir, mãe», dizem, como quem está a dizer outra coisa, insondável, como quem diz: até nisso a vamos avaliar.
E levamos. Ah, bolas, se calhar era melhor não ter vindo, coitada. Que seca! E ter que ouvir assim, de chofre, assim no papel, todas as suas (in)capacidades, tudo o que é e não é, tudo o que consegue e não consegue, assim, de forma tão crua e tão redutora, assim se avalia uma pessoa num escrutínio meramente intelectual. E se enxofram uns pais, que só têm vontade de deitar tudo às urtigas, pegar na miúda e não mais voltar a este universo que se afigura cruel. E ficamos a pensar se escolhemos o bom caminho, o menos mau, o que tinha que ser, ou sei lá. Sabemos lá.
Para a próxima não vem. A miúda. Ah, chatice, afinal era para ter vindo.... Alho francês e hortelã!

E aguentamos. Com o formigueiro. Se a miúda aguentou, não houvéramos nós de aguentar, pois então?

E o carro da GNR passa, lento, mas passa.
Ufa, desta correu bem. Vamos à próxima. Mas sempre atentos, ainda assim...




quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Zacas, Zecas, Zicas, Zocas, Zucas

Tenho uma tia que, quando éramos mais pequenos (nós, lá de casa, mais a catrefada de primos), às vezes passava uns dias connosco nas férias. Era daquelas tias cuja imaginação fértil nos fascinava!!!
Não era (nem é) nada daquelas pessoas de gugu dadá, nada de bebezices nem infantilices.
Mantinha um ar seríssimo no seu discurso, aquele ar que nos fazia balouçar entre o real e o absurdo.
Todas as noites ela ia visitar-nos ao quarto e contava uma história. Mas calma, não era sempre ela.
Uma noite era a Zacas (de verdade!), outra a Zecas, depois vinha a Zicas, a Zocas e a Zucas. Cada noite éramos visitados por uma diferente personagem, embora o invólucro fosse o mesmo, o que ainda aumentava mais a magia.

Bom, cá em casa às vezes também tenho destas visitas, em permanência, mas nunca sei por quanto tempo....

Chego a baralhar-me, só não desespero graças à Zacas (ou Zecas, ou Zicas....)!
 Passo a explicar, e quem vive com disléxico é capaz de me entender:

Dia 1
- Mãe, amanhã tenho teste de matemática, só hoje a professora avisou! Pânico!
- Ok, vá, vamos lá ver o que é que sai - digo eu, aparentemente calma, eu que ODEIO matemática visceralmente, mas vá...
E lá vamos ver, a afinal a miúda sabe tudo, e tão bem, explicou-me tudo na maior, notações científicas e afins, bom, ufa, que alívio!
- Vês, afinal sabes, vai correr tudo bem, boa!

Dia 2
- Então o teste, querida?
- Desgraça total!
- Mas então, não saiu o que estudámos?
- Sim, mas esqueci-me de como se fazem as notações...
- Mas como, esqueceste-te? Foste tu que me ensinaste, estava tudo tão consolidado, não percebo...?
- Ó mãe, esqueci-me. E depois tive mais 45 minutos de aula, e não consegui escrever nada.
- Em 45 minutos não escreveste nada? Absolutamente nada?
- Ó mãe, perdi-me, 1º eram os sumários, não apanhei, depois tentei escrever o que a professora estava a ditar, mas também não apanhei, depois tentei voltar aos sumários e copiar da colega do lado, mas baralhei-me, passei a aula 57 no sítio da 56 mas a dizer 51...
- Ó Meu Deus, eu é que já me perdi!
- Pois, eu também!

- Ah, mãe, e é verdade, amanhã combinei encontro antes do jantar às 7h15.
- Mas o jantar não é no sábado?
- Ah, pois, é depois de amanhã...
- E não é às 8h? Demoram 45 minutos para subir a rua????
- Ah, sim, pois, é às 7h45 o encontro..

Compreendem? Um dia tenho uma Zacas, responsável, que sabe as horas, que aponta tudo para não esquecer nada, e vejo uma luz ao fundo do túnel - Oh, está tudo a encaminhar-se, que bom! Fico tão babada...
No dia seguinte, sem nenhuma explicação aparente, surge uma Zecas distraída, que se perde nas horas e nos dias, e que bloqueia assim, do nada!

Amanhã, teremos Zocas? Zucas? Hmmm.... mistério...

Ainda bem que odeio a rotina! Ufa!  :)


terça-feira, 19 de novembro de 2013

De como a Bíblia é ignorada por estes dias

Recebemos um telefonema há dias. Domingo. 20h, mais coisa menos coisa. Hora da janta, dia de descanso, que se Deus pôde, nós também queremos.
Pois, ligaram a perguntar se era a mãe de R.
- Sim, sou, quem fala?
- Fala do Instituto X, queria marcar uma reunião consigo amanhã à hora tal, na escola.
- ...
- Sim? Sr.ª D. S....?
- Desculpe, estou só aqui a rever a minha agenda mental, é que passei o dia convencida que era domingo (o tal dia em que um senhor lá de cima se fartou de trabalhar e decidiu que um descanso era merecido).
- Pois, tem razão, mas é que estamos com tudo muito atrasado...
- Ah, bom (cá com os meus botões... atrasado? tem graça...), conte-me então...
- Podemos então marcar uma reunião para amanhã, para obter informações de R. e analisar da possibilidade dela beneficiar de sessões de terapia da fala? Precisamos que leve comprovativo de morada, fotocópias de ccs e de declaração de rendimentos de TODO o agregado familiar, mais ....
- Alto, alto, alto. Vamos lá parar por aqui. Está-me então a dizer que:
1. O apoio para alunos ao abrigo do decreto lei n. 3 afinal não é para todos?
2. O processo, que no nosso caso nos consumiu 2 anos, que obrigou R. a ser avaliada por terapeutas, psicóloga, reuniões, papelada, mais reuniões, conselhos de turma, mais reuniões, mais papelada, ..., afinal ainda não acabou?
3. Não obstante o Estado escrutinar a nossa economia caseira até ao último tostão, e tanto as finanças como a segurança social terem toda a nossa vida escarrapachada nos seus ficheiros, ainda temos que ir tirar mais umas cópiazinhas para comprovar aquilo que já sabem?
4. Subentende-se que, sendo a Segurança Social agora quem paga estes apoios, dados por empresas privadas a quem adjudica a tarefa, só beneficiaremos se formos mesmo, mesmo muito pobrezinhos?
5. E subentende-se também que estes apoios serão escassos, temporários, logo pouco beneficiando os alunos, criando antes instabilidade?
- ... bom... pois....
- (coitada, senti quase uma certa compaixão pela menina)

Resumindo, agradeci o empenho da doutora que estava a trabalhar a um domingo, para uma empresa privada com quem a segurança social estabeleceu uma relação cujo teor desconheço, e que teria a ingrata tarefa de descartar alunos com necessidades específicas por não serem suficientemente pobrezinhos ou por qualquer outra justificação que sirva os intentos económicos deste tal dito Estado Democrático.

Acrescente-se que, no ano passado, o processo de R. foi tão moroso que só no 3º período começou a ter apoio da escola - uma terapeuta da fala que só tinha meia dúzia de horas adjudicadas àquela escola e que, portanto, tinha que partilhar o tempo com mais de um aluno. R. teve 2 sessões com essa terapeuta, que entretanto se ausentou. Mais reuniões dos pais com diretora de turma (extraordinária, felizmente), nova terapeuta, mais reuniões, novo método, 2 sessões, ano acaba, apoio termina. Ponto.

E agora isto! Estamos em final de novembro... tem graça... e a nós, que sempre nos disseram que quem dá e tira ao inferno vai parar! Mais inferno ou menos inferno, a ideia lá nos fica, não é? Isso de dar e tirar não é de pessoas de bem. Não, senhor, não é!

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Toma um tocafé que isso passa

Lembram-se da publicidade? Pegou e ficou, de tal maneira que servia para tudo, à laia de receita milagrosa que cura enxaqueca, unhas encravadas e males do coração. E dava até para a dislexia, que na altura pouco se adiantava e muito se mistificava. Era o "deixa andar", na esperança que o tempo resolvesse aquilo que nós não soubemos ou não quisemos resolver.

Por cá deixámos andar tempo demais, como já se viu. Entre o passo 1, o passo 2 e todos os outros que virão, aconselho sempre: S.O.S.

Sabem aquela teoria de que qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo, precisa apenas de 7 telefonemas para chegar ao Presidente dos EUA? Basta ligar àquela pessoa certa, que por sua vez conhece a pessoa certa, que conhece a pessoa certa, ..., ..., ..., ...., Obama?

Bom, a nós bastaram dois telefonemas e uma conversa de amigos, para chegar à terapeuta certa. Os dois telefonemas serviram para chegar à MAIS CONCEITUADA. A conversa de amigos serviu para chegar à NOSSA MELHOR.
Como em tudo na vida, primeiro pensamos, depois sentimos, e então escolhemos. É a tal "fezada" bem à portuga.
 É mesmo assim, não há tamanhos únicos, o que serve a uns não serve a outros, por isso há que pesquisar, conhecer, e confiar.
Nada fazer é que não é válido, e não pedir ajuda, não falar sobre, também não. A jornada é longa, e os apoios são preciosos, não só pelo seu contributo intrínseco, mas também pela auto estima que se recupera ou se ganha, que é o bem que mais devemos preservar.

Na dúvida, insista. Na certeza, persista. O Tocafé nem é grande coisa, beba um bom café à séria, e faça-se rodear de bons profissionais.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

3º passo: o diagnóstico (ou de como o Estado de Kafka se mantém bem vivo)

Nunca fui muito de colecionar. Bom, namorados talvez ainda fossem alguns, agora de resto... lembro-me de colecionar uns cromos da Vida Selvagem, uns outros d'Os Aristogatos da Disney, ainda passei pelos selos, mas tudo de forma ligeira, nunca fui aficionada.
Nem doenças, é verdade, quando me encontro nos bancos do centro de saúde até chateia, não tenho nada para a troca, nem ites nem ortes nem ões, nada que valha a pena exibir.
Ah, mas agora a coisa mudou! Já andávamos a sentir o Kafka agitado ali na prateleira, e desde que abrimos o processo (o da miúda, não o do K.), foi uma revelação! Tombaram-nos em cima uma quantidade de acrónimos e siglas numa coleção formidável, quase impossível de deslindar.

TAPAL - PE
                                         GOL-E
PAOF
                                                                                 ESSA
NEE
                             PEI
(...)
(...)
Poupo-vos ao resto, mas vou já avisando que o sistema instalado não vos vai ser tão benévolo.
E não, não inventei nenhuma, todas têm significado...
Mas há uma que terão mesmo que saber, pois é a tal reconhecida internacionalmente e que por cá se usa, se querem ter algum apoio estatal:
a CIF - classificação internacional de funcionalidade, incapacidade e saúde.

Dito de outra forma, é o referencial quantificador que avalia e mede a saúde e a (in)capacidade (meus parênteses) de cada indivíduo. É assim uma espécie de diagnóstico generalista, aceite pelas Nações Unidas e pelo nosso Ministério da Solidariedade e Segurança Social, que dá para tudo, segundo dizem: saúde, educação, segurança social, emprego, economia (????), etc, etc.

A CIF é, portanto, o cartão de apresentação que nos permite dar início a toda a parafernália de burocracias que se seguirão. É uma espécie de documento batismal, sem o qual não poderíamos piscar o olho ao Decreto Lei n.º 3, nem ganhar vitoriosamente um PEI (Programa Educativo Individual).
Aconselho um bom aquecimento prévio, uma releitura d'O Processo não será demais. Digo eu.

«E como duram os processos deste género, especialmente há uns tempos para cá!» 
F. Kafka, O Processo.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

O peixe que inverteu a história

Hoje partilho um video de Sam Barclay - designer, educador e disléxico, que uma querida amiga me enviou: «I wonder what it's like to be dyslexic». É um curioso projeto, ainda em fase de captação de fundos, mas visualmente muito giro.

E na linha de pensamento da comunicação por imagens e signos, é fascinante perceber o mundo visual do pessoal cá de casa. Eu que, por acaso, sou mulher das teorias visuais, designs e afins, fico completamente remetida ao banco dos suplentes! O grave é que, realmente, estamos inconscientemente tão agrilhoados à PALAVRA, escrita ou oral, que nos passa ao lado o significado intrínseco dos símbolos visuais e das composições das imagens.

Outro dia vimos um filme. Os três. No dia seguinte estávamos na troca de ideias sobre a coisa. Não que fosse uma história particularmente relevante, era simpática. «Atores giros, o diálogo teve alguns momentos de valor, a fotografia foi o melhor, o enredo geral previsível, embora com momentos invulgares» foi a minha opinião sobre o filme.
«Hmmm, o que eu gostei mais no filme foi a analogia entre o momento inicial em que o homem, no meio da multidão, num percurso rotineiro, pára, vira-se para trás, e inverte o seu destino, e o momento final em que um peixe, no meio do cardume, também pára e inverte o seu destino, levando todos os outros peixes atrás.» - este foi o resumo da filha, consonante com o do pai.
(...)
Ok, estão a gozar comigo? Sim, era óbvio que os peixes iriam virar, se não o filme acabava mal, mas esse detalhe de UM PEIXE em particular fazer o mesmo do personagem principal, passou-me mesmo!!

«Sabes, mãe, é que tu devoras os filmes, assim à pressa, tudo misturado, em vez de apreciares cada imagem por si».
Aiaiaiaiai...

E fiquei até agora a matutar na coisa... quanta informação é que o nosso cérebro não descura, com esta ganância de absorver tudo à bruta, palavras, sons e imagens, em alta velocidade? O que ganhamos em tempo ao apanhar o TGV em vez de ir pela nacional, perdemos em experiência e conhecimento, por não termos tempo para VER/ ABSORVER/REFLETIR.

São pensamentos...

Ficam então aqui as palavras do designer Sam, as tais que não são mais do que representações visuais de sons, de fonemas, e outros emas de que já terão ouvido falar, seguramente, pelos profissionais que vos apoiam:

I wonderwhat it's like to be dyslexic  (clicar em cima do título)




sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Raquetes e Talheres

Venho de uma família grande, daquelas típicas, que no verão iam para o Algarve, com bicicletas no capot e o carro atulhado até às costuras de barco de praia, raquetes, roupa para 2 meses, e nós, os putos, à balda lá pelo meio – na verdade, o cinto era dispensável quanto mais não fosse porque íamos rodeados de airbags improvisados.

Portanto, ir para a praia jogar às raquetes era qualquer coisa que fazíamos horas a fio, e que toda a gente sabia, nem se pensava nisso.
Quando a minha cara metade passou as primeiras férias de verão connosco confesso que fiquei baralhada. E contem lá a história de que o amor move montanhas, e tal, vá, se calhar até sim, mas acertar na bola, isso já não é para todos…
Acabei por desistir, convencida que era uma coisa dele… mas quando a versão júnior nos aparece na vida, e a coisa se repete… bolas!

De facto, mesmo em pequena, muitas das coisas que a miúda fazia deixavam-me confusa… não só mostrava dificuldade em memorizar canções e rimas, mas também parecia não automatizar alguns movimentos, como jogar raquetes, ou comer à mesa. Mas era capaz de passar uma tarde inteira a gastar rolos de fita cola para criar uma instalação artística no quarto, ou, com dois anos, ficar duas horas a ver o Fausto no Mezzo, fascinada... bons tempos!

Mas são estes detalhes que, apesar de estranharmos, não associamos à dislexia. Esta questão de automatizar procedimentos rotineiros não é linear. 
Se estão alerta, conscientes, corre bem, mas no segundo em que já estão focados noutra ideia, o corpo esquece o que estava a fazer e como deve fazer. Lá fica a faca virada ao contrário, ou a cortar o bife da maneira mais estapafúrdia que se possa imaginar. 

É que não é previsível, não é automático, pode mudar tantas vezes quantas as que puderem existir. É giro, lá isso é, mas caramba! Não podiam ser só um bocadinho mais iguais a mim, para variar? Mais rotineiros e formatados, mais dentro do sistema? Só assim de vez em quando…

Que digo eu, não é? Pois, é mesmo essa a grande vantagem da dislexia: descobrir mundos novos onde todos julgamos já ter visto tudo, procurar novas formas de o ver e refazer, descobrir soluções onde outros só vêm problemas.

Nestas minhas deambulações sobre o tema, descobri um livro que me pareceu valer a pena ter. Na verdade, procurava alguma literatura séria sobre como potenciar as vantagens da dislexia, e o título deste soou-me bem: The Dyslexic Advantage - Unlocking the Hidden Potential of the Dyslexic Brain, DR Brock L. Eide & Dr. Fernette F. Eide, ed. Hay House, 2011, USA.

Na altura, estava já a enjoar o discurso recorrente dos exemplos de génios, de famosos ou de milionários disléxicos, como Einstein ou Tom Cruise, Da Vinci ou Richard Branson. A mensagem geral parece ser: o tempo de escola é um sofrimento, mas há que passá-lo, quando fores adulto vais revelar-te e poderás então regozijar-te. 

Para mim estas ideias revelaram-se claramente insuficientes - explicar a uma criança que tem que sofrer uns ANOS é um conceito demasiado abstrato - o que é isso, anos? Acaba amanhã, ou quando for Natal? E, no meu caso, explicá-lo uma adolescente hiper consciente (que só foi sinalizada aos 12 anos), ainda pior! «Odeio a escola! Odeio ser diferente!»

Cá em casa professamos mais a teoria do momento: deveremos tornar o momento o melhor possível, dar o nosso melhor e aproveitar o que nos é dado. Perdoem-me o estrangeirismo, mas a melhor palavra que encontro é «ENJOY!». Portanto, vamos procurar outras alternativas para chegar ao dito.

O referido livro começa por abordar as diferentes teorias sobre a dislexia e a sua evolução no tempo. Agradou-me a recente teoria de Angela Fawcett e Roderick Nicolson, «Procedural Learning Theory», que refere não só os aspetos da linguagem mas também os diferentes sintomas comummente encontrados em pessoas disléxicas e que não estão diretamente relacionados com a fonologia e linguagem: as funções motoras e a coordenação. Lá está, raquetes e talheres! Afinal não inventámos nada, há mesmo outros sinais para além das questões fonológicas, que são comuns aos disléxicos.

Vou continuar a leitura…deixo-vos um excerto:

«Another strength of the procedural learning theory is that it predicts some of the advantages that we often observe in individuals with dyslexia. For example, while poor automaticity in routine skills makes many individuals with dyslexia slower and less efficient on routine tasks, it also forces them to approach these tasks with a greater “mindfulness” or task awareness and to really think about what they’re doing. As a consequence, we’ve found that individuals with dyslexia often innovate and experiment with routine procedures, and in the process find new and better ways of doing things.» (Eide & Eide, 2011)






quinta-feira, 7 de novembro de 2013

«My Dyslexic Mind» - a história de Ben em 3'59''




Ben tem 12 anos e, adivinhe-se, é disléxico. Num formato de animação bem simples, conta-nos a sua história, sem dramas, só assim. Em inglês. Espreitem o link: 

Paralelamente ao filme, a BBC Newsround promoveu experiências interativas no que se designou «Try Being me»: http://www.bbc.co.uk/newsround/20789777






quarta-feira, 6 de novembro de 2013

2º passo: pesquisar definições dos especialistas na matéria

E nós a dar-lhe com a mania de pertencermos a uma classe média esclarecida, urbana, confiante que o género humano atingira, seguramente, um patamar de conhecimento que nos relaxaria a todos, em particular no que toca à saúde das nossas crias. E se, no fim, o sistema falhasse, o instinto maternal, esse, seria valor seguro. Claro... que não!!!
Mas afinal a miúda nem é assim de trocar letras ou desenhá-las ao contrário, nunca foi, ou não mais do que o usual. Não é esse o sinal mais evidente da Dislexia? Hmmm, pois não é, nem sempre é. Nem a sociedade da informação, nem os cursos superiores, especializações e afins, nem o sistema educativo e de saúde e, pior, nem o instinto maternal, nos informam destas coisas. E mesmo que informassem, o nosso cérebro é demasiado elitista, seleciona informação e só armazena a que considera relevante.

Deixando de lado essas considerações, toca a consultar a nuvenzinha virtual, a nossa bolinha de cristal do século XXI, a ver o que mais nos diz:

Dislexia - pesquisar - PORTAL DA DISLEXIA http://dislexia.pt/definicao/

E lá vêm enumeradas algumas definições (que, entenda-se, a coisa não é consensual), mas muito grosso modo, o principal a saber:


  1. O que é? A Dislexia é uma dificuldade de Leitura e de Escrita (é mais, claro, mas um passo de cada vez ...)
  2. Causas? Deve-se, julga-se, a alterações genéticas, neurológicas e neuro linguísticas;
  3. De quem é a culpa? Existem cromossomas ligados à Dislexia cujos genes ainda estão por identificar. A quem achar o culpado, agradece-se divulgação;
  4. E onde anda, essa dislexia? Localiza-se no hemisfério esquerdo do cérebro: lobo temporal, occipital e parietal.
  5. E como é que a mandamos embora, se for indesejada? A Dislexia é uma característica pessoal, portanto, permanente, mas com vantagens futuras extraordinárias, desde que o indivíduo saiba explorá-las da melhor forma - claro que ajuda IMENSO contar com o grande apoio da malta da família e amigos, para elevar a auto estima, e dos especialistas e professores, para contornar o sistema educativo formal, tão aborrecido e formatado!
  6. A quem é que calha? A dislexia SÓ CALHA a indivíduos com normal ou superior inteligência, sem nenhuma outra perturbação ou défice cognitivo.
Alguns sinais:
DIFICULDADE DE MEMORIZAÇÃO/ 
LENTIDÃO NA DESCODIFICAÇÃO DA PALAVRA ESCRITA/ 
DIFICULDADE NA PRODUÇÃO DE TEXTOS/ 
INIBIÇÃO E RECUSA DE LEITURA EM VOZ ALTA, PELA DIFICULDADE SENTIDA/ 
BAIXA AUTO ESTIMA/ 
RECUSA DE IR PARA A ESCOLA/ 
IMENSO TEMPO PARA EFETUAR OS TRABALHOS ESCRITOS OU QUE REQUEIRAM INTERPRETAÇÃO DE PERGUNTAS, DE TEXTOS,.../ 
CANSAÇO INTELECTUAL, PELO ESFORÇO ACRESCIDO DE CONCENTRAÇÃO/
POUCA AUTONOMIA NA EXECUÇÃO DOS TRABALHOS ESCOLARES/
APARENTE TIMIDEZ E FALTA DE REAÇÃO OU, POR ANTÍTESE, APARENTE VIOLÊNCIA E EXCESSO DE DISTRAÇÃO (por vezes confundida com hiper atividade).

E por agora já chega, para não entrarmos no modo de leitura diagonal...

Não é demais referir que a intenção deste blog é dar uma perspetiva INFORMAL da Dislexia, com base na experiência própria. Não pretende ser nenhuma fonte de diagnóstico, nem dispensa o aconselhamento de um profissional na matéria, seja Terapeuta da Fala, Psicólogo, Neuropsicólogo, Neuropediatra, apoio da Escola, etc.




terça-feira, 5 de novembro de 2013

O cérebro num minuto e quarenta e seis segundos

Um pequeno video sobre o percurso das palavras lidas no nosso cérebro e o que é diferente na dislexia.


segunda-feira, 4 de novembro de 2013

1º passo: pesquisar a definição na wikipédia

E um dia levamos com um estalo na cara. Sim, andamos uns anos nisto, com alguma estranheza, de vez em quando umas pistas de que algo não corre dentro dos parâmetros da dita «normalidade», mas vamos andando. A miúda é gira, uma simpatia, tem um universo criativo muito próprio, é distraída, sim, mas também o pai, pronto, é mesmo assim.
Umas conversas com as professoras - não, deixem andar, isso é só preguiça e distração, mais nada - e lá deixamos andar.
E um dia levamos com um estalo na cara! Pois, há sempre um momento em que se afigura claro que não é preguiça nem distração, e que já devíamos ter mexido o rabinho há muito...
Bom, respiramos, tentamos perdoar a nossa cegueira e lá vamos a isto.
Primeiro passo:

Afinal, exatamente o que é isso da Dislexia?

Na wikipédia, reza assim (à data, entenda-se):

Dislexia (do grego Δυσλεξία, dis- distúrbio, lexis palavra) é uma dificuldade na área da leitura, escrita e soletração, que pode também ser acompanhada de outras dificuldades, como, por exemplo, na distinção entre esquerda e direita, na percepção de dimensões (distâncias, espaços, tamanhos, valores), na realização de operações aritméticas (discalculia) e no funcionamento da memória de curta duração. A dislexia costuma ser identificada nas salas de aula durante a alfabetização, sendo comum provocar uma defasagem inicial de aprendizado.1

Sim, reza mesmo assim, com erros e tudo, tal qual. Já sabemos, esta coisa da enciclopédia para todos e por todos dá nestas meias incertezas. Não se fiem no ar científico da coisa, porque este assunto tem muito mais que se lhe diga. Já se percebeu que a jornada vai ser longa, não vai ser só respirar e perdoar, vai haver muito transpirar e muito desesperar. Mas seguramente, muita persistência, que daqui não arredamos mais pé!



sexta-feira, 1 de novembro de 2013

O famoso Decreto Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro

O famoso Decreto Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro, que não dispensa a leitura do DL 319/91, de 23 de Agosto:
(clicar em cima)

DL 3/2008

DL 319/91


GloCal Vision - um video sobre a APPDAE

http://www.youtube.com/watch?v=nefj938qcpQ&feature=share

(clique em cima)

http://www.appdae.net/index.html


Vá, um bocadinho de auto comiseração...

You Are Not Alone

Video partilhado através de The National Center for Learning Disabilities.
«Does your child have learning and attention issues such as dyslexia, ADHD, auditory processing disorder or problems with executive function? You're not alone—here on LD.org we represent a community of 60 million people. Share this video with friends and loved ones whose children or students are struggling with LD or related issues.»

http://www.youtube.com/user/NCLD1401

O que são as DAE?

DAE - Dificuldades de Aprendizagem Específicas ou LD - Learning Disabilities

No video do National Center for Learning Disabilities, em Nova Iorque, Dr. Sheldon Horowitz, explica:

http://www.youtube.com/watch?v=yG_xSBsFMPQ